A imposição de uma norma-padrão anacrônica e sem fundamentação nas práticas linguísticas autênticas, mesmo das camadas mais letradas da população, tem o efeito pernicioso de levar as pessoas a desistir de empregar determinadas formulações sintáticas pelo medo de “errar”. Um dos exemplos mais visíveis dessa situação tem a ver com o uso do pronome “se”, que há duzentos anos vem assombrando as pessoas que falam e sobretudo escrevem em português.
Já em 1918, o grande filólogo brasileiro Manuel Said Ali chamava a atenção para a irracionalidade de se cobrar uma concordância plural do tipo “alugam-se estas salas” com a desculpa andrajosa, esfarrapada e maltrapilha de que equivale a “salas são alugadas”. E ele diz que se alguém colocar um cartaz dizendo “estas salas são alugadas” é mais do que justificado que se duvide de sua “sanidade mental” (palavras de Said Ali). Existe uma diferença semântico-pragmática escandalosa entre “aluga-se estas salas” e “estas salas são alugadas”.