VOCABULÁRIO DO PORTUGUÊS

 

(VOC) - mais do que mera lista de palavras

 

O Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa (AO) de 1990 previu a elaboração de um vocabulário ortográfico comum. Sua elaboração é, portanto, uma consequência natural do AO e deve ter caráter ecumênico. Ou seja, um vocabulário ortográfico não apenas nacional – como até 1990 – mas um instrumento geral consolidador da ortografia definida pelo AO e representativo de todos os países de língua oficial portuguesa.

 

Foi o Plano de Ação de Brasília para Promoção, a Difusão e a Projeção da Língua Portuguesa, saído da I Conferência Internacional sobre o Futuro da Língua Portuguesa no Sistema Mundial, promovida pela CPLP-Comunidade dos Países de Língua Portuguesa em 2010 em Brasília, que desencadeou a elaboração do VOC, atribuindo-a ao IILP-Instituto Internacional da Língua Portuguesa.

 

O IILP buscou cumprir essa tarefa, dando início, no período em que o Prof. Gilvan Müller de Oliveira foi seu diretor executivo (2010-2014), ao projeto do Vocabulário Ortográfico Comum (VOC). Para isso, desenvolveu algumas importantes ações:

 

(1) assinou um acordo de cooperação técnica com o ILTEC - Instituto de Linguística Teórica e Computacional (hoje vinculado à Universidade de Coimbra), pelo qual esse Instituto assumiu a planificação e execução técnica do Vocabulário Ortográfico Comum (VOC), aproveitando sua experiência no desenvolvimento de várias ferramentas ortográficas, em especial o VOP – Vocabulário Ortográfico Português, adotado como referência oficial na aplicação do AO em Portugal pelo Conselho de Ministros em 2011;

 

(2) fez gestões junto ao governo português e à Academia Brasileira de Letras para obter a cessão das bases do VOP e do VOLP, respectivamente, para serem integradas ao VOC. Ambas as gestões foram exitosas, o que garantiu um excelente ponto de partida para a elaboração do VOC, que agregou, pela primeira vez na história, as bases ortográficas portuguesas e brasileiras num único instrumento de referência.

 

O IILP realizou, então, uma reunião técnica internacional em 2011, na cidade da Praia, Cabo Verde. Nessa reunião foram definidos os procedimentos metodológicos para a constituição do VOC; para a incorporação do VOP e do VOLP; e para a elaboração de Vocabulários Ortográficos Nacionais dos países que ainda não dispunham de um.

 

Ficou também estabelecida a constituição de um Corpo Internacional de Consultores com especialistas de cada país da CPLP para atuar junto à Equipe Central do VOC, analisando tecnicamente os critérios propostos por essa Equipe para chegar a um consenso interpretativo e contornar, quando necessário, eventuais omissões e incongruências do texto do AO. Esse corpo de consultores discutiu e validou interpretações comuns para a aplicação de algumas bases do AO, alcançando uma notável convergência de critérios.

 

Foram realizadas, em 2013 e 2014, quatro consultas a esse corpo de consultores, envolvendo a acentuação, o uso do hífen, a incorporação de estrangeirismos e o trato das chamadas sequências consonânticas, importantes pela variação que motivam e pela eliminação das chamadas consoantes mudas, aquelas que não são pronunciadas em nenhum dos países.

 

este precioso acervo foi constituído por meio de uma metodologia única e uniforme

 

Os trabalhos se desenvolveram a contento, tendo recebido apoio financeiro do governo de Angola e do Instituto Camões. Uma primeira versão do Vocabulário Ortográfico Comum (VOC), incluindo o Vocabulário Nacional de quatro dos oito países de língua oficial portuguesa (Brasil, Moçambique, Portugal e Timor-Leste) foi apresentada na II Conferência Internacional sobre o Futuro da Língua Portuguesa no Sistema Mundial, em 2013, sendo reconhecido oficialmente, já com a incorporação posterior do VON de Cabo Verde, na X Conferência dos Chefes de Estado e de Governo da CPLP, realizada em Díli (Timor-Leste) em 23 de julho de 2014.

 

Com a finalização do VON de São Tomé e Príncipe, passamos a dispor de quatro novos Vocabulários Ortográficos Nacionais ao lado dos Vocabulários brasileiro e português, passo essencial para a aplicação do AO nesses países e preenchimento de uma lacuna lexicográfica considerável.

 

Todo este precioso acervo foi constituído por meio de uma metodologia única e uniforme, desenvolvida segundo o padrão tecnológico mais avançado existente no campo, com parceiros de reconhecida tradição na área e consensuada em diferentes instâncias, e está posto numa base tecnológica avançada que:

 

(a) permite ampliar as informações disponíveis sobre cada item lexical, quais sejam, o paradigma flexional, a divisão em sílabas, a marcação da sílaba tônica e relações funcionais com outras entradas, especificamente com palavras morfologicamente relacionadas;

 

(b) favorece seu reaproveitamento para ferramentas de processamento da linguagem natural (como os corretores ortográficos) e para a pesquisa científica;

 

(c) facilita as consultas dos especialistas e do público em geral;

 

(d) deixa pronta a via para futuras atualizações.

 

O Vocabulário Ortográfico Comum (VOC), é uma base de dados lexicais eletrônica de grande escala e aberta. Inclui não apenas o vocabulário comum a todas as variedades nacionais da língua portuguesa, mas também os vocabulários próprios de cada uma dessas variedades. É possível uma consulta geral obtendo os espaços de que é característica cada forma, bem como uma consulta específica, na medida em que cada Vocabulário Nacional mantém sua integral autonomia no interior do VOC.

 

o Vocabulário Ortográfico Comum (VOC) já conta com aproximadamente 310 mil palavras

 

O Vocabulário Ortográfico Comum (VOC), não é, porém, uma mera lista de palavras. Seu principal objetivo é construir uma base de dados lexicais de livre acesso e representativa do léxico contemporâneo do português. Ele não apenas reproduz as informações contidas nos trabalhos lexicográficos existentes, mas também agrega o uso corrente da língua em todos os países em que o português é língua oficial e poderá servir, no futuro, como base para um grande dicionário geral da língua. No momento, o Vocabulário Ortográfico Comum (VOC), que já conta com aproximadamente 310 mil palavras, pode ser consultado no endereço voc.iilp.cplp.org

 

A sua elaboração tem também outro efeito importante, qual seja, a consolidação de critérios mais objetivos para resolver contextos ortográficos tradicionalmente problemáticos, como as regras de hifenização e a adaptação de palavras importadas de outras línguas. Há, portanto, toda uma dimensão generalizadora no Vocabulário Ortográfico Comum (VOC), que pautará sua atualização futura e a gestão conjunta da ortografia do português.

 

E, para concluir, é importante dizer que o mais importante do processo de elaboração do Vocabulário Ortográfico Comum (VOC), é que ele tem servido de parâmetro para outros projetos, atuais e futuros, do IILP, no sentido de apresentar um modelo multilateral e compartilhado para a gestão da língua portuguesa, seja no campo da planificação do corpus, seja no campo da planificação do ensino/aprendizagem, dividindo custos de desenvolvimento e otimizando resultados comuns para todos os países.

 

Uma língua internacional e pluricêntrica como o português exige precisamente esse tipo de gestão multilateral e compartilhada que supere os apegos nacionalistas e patrimonialistas que ainda perturbam a dinâmica sociopolítica do português como língua internacional e sua projeção mundial.

 

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