Produção textual acadêmica: como [não] transformar sua tese em livro

Dicas do editor da Parábola Editorial

 

Muitos pesquisadores em Letras/linguística já sabem que a Parábola Editorial não publica dissertações de mestrado, teses de doutorado; muito menos, nunca mesmo, trabalhos de conclusão de curso [TCC].

 

Esta postagem me dá a oportunidade de esclarecer algo que afirmo sempre como injunção, sem explicar mais claramente. Óbvio, a posição aqui assumida vale unicamente para a construção do catálogo da Parábola Editorial. Todo outro editor pode pensar e agir diferentemente. Todo outro catálogo pode ser construído diversamente quanto à produção textual a ser transformada em livro. E assim, todo autor pode publicar sua tese. As dicas aqui elencadas são o pensamento e os procedimentos seguidos pelo editor da Parábola e seu conselho.

 

Aqui brincamos sério dizendo: se aceitássemos publicar todas as dissertações e teses que nos são oferecidas, já teríamos, de 2001 até agora, uns três mil títulos em catálogo. Como não conseguimos aprovar essa produção textual para publicação, giramos ainda em torno dos duzentos títulos, um catálogo pequeno, mas que já nos dá a confirmação do acerto de nossa estratégia editorial a partir do reconhecimento irrestrito de nosso público.

 

É muito comum recebermos dissertações e/ou teses com vistas à publicação. E quando dizemos que não as publicamos, a réplica sempre vem na forma de solicitação de orçamentos de edição paga pelos autores.A gente se mantém firme e diz que o catálogo da Parábola Editorial se constitui unicamente de obras lidas, aprovadas e contratadas para edição mediante cessão de direitos autorais das produção textual que passa por nossos crivos de avaliação. Esta postagem é, então, a ocasião perfeita para nos explicar. Para nos entender, autoras, autores e editora.

 

1. Claramente, sair da banca de defesa com aprovação e grau de doutor[a] ainda não é ter um livro pronto, mesmo tendo se tornado parte do rito de defesa ouvir de um ou de todos os arguidores o comentário: “Sua dissertação/tese está indicada para [imediata] publicação”. A indicação virou mero protocolo.

 

Até hoje, só deparei uma dissertação e duas teses prontas para serem publicadas: a dissertação de Dante Lucchesi, publicada como Sistema, mudança e linguagem; as teses de doutorado de Marcos Bagno [Dramática da língua portuguesa, da qual sou editor, mas em outra editora] e de Ana Lúcia Silva Sousa [Letramentos de reexistência, também publicada pela Parábola Editorial, depois da indicação de publicação de Roxane Rojo, que sabia de minha presença na plateia]. E, claro, sem esquecer a clássica tese doutoral de Stella Maris Bortoni-Ricardo, Do campo para cidade: estudo sociolinguístico sobre migração e redes sociais, originalmente publicada em inglês e trinta anos depois publicada também por nós como homenagem à fecundidade da trajetória da autora.

 

Depois de ouvirem a frase “indicada para publicação”, doutoras e doutores apontam uma metralhadora de argumentos direto para a cabeça de algum editor: “… mas a banca indicou minha pesquisa como de imprescindível publicação”. Isso não é [de todo] verdade; toda produção textual oferecida precisa ser atentamente verificada pela editora. E o resultado é que chegamos à conclusão de que a maioria quase completa das teses se inscreve no registro da escrita e nele se esgota, sem alcançar ainda o registro da leitura. Quer dizer: elas estão destinadas exclusivamente à demonstração de estarem os candidatos à altura do título acadêmico pleiteado por meio da leitura, qualificação e arguição por parte da banca, sem conseguir despertar atenção suficiente para serem lidas pelo amplo público que é nosso alvo.

 

2. 

Você também ainda não tem um livro pronto quando simplesmente alivia o peso do aparato crítico sobre sua pesquisa [especialmente as notas de rodapé que vão pontuando as referências fundamentais de sua produção]. É muito comum ouvir: “Transformei minha pesquisa em livro. Transformei minha tese. Tenho agora um livro e solicito que a Parábola Editorial o analise”.

 

Ao analisar o projeto, nos damos conta de que a tese está inteira ali, tendo os cortes sido feitos apenas no rodapé. O capítulo de fundamentação teórica está ali na íntegra. Ele é obrigatório na tese, mas quase sempre incompreensível, entediante para um público-leitor amplo. O capítulo metodológico está ali. Descritivo e desanimador. Muitas vezes, fundamentação teórica e metodologia configuram 50% da pesquisa.

 

 

 

E quando a fundamentação teórica é mera revisão bibliográfica de autores sobejamente conhecidos pelos leitores da área? Quando cita obras de referência estudadas à exaustão, sem nenhuma novidade teórica para o público? As hipóteses de pesquisa e sua comprovação também se mesclam comumente com fundamentação e metodologia, o que leva mais uns 20% da pesquisa. E quando a conclusão da pesquisa, o núcleo para uma edição em livro, ocupa apenas 20 de 300 páginas?

 

3. O que nos resta? “Muito pouco quase nada” para oferecer a um público leitor que, ao adquirir um livro derivado de uma tese, está certamente buscando não a tese [gênero de escrita, quase nunca de leitura, insisto] e se sentirá completamente alheio ao conteúdo impresso naquela produção textual, justamente por se tratar de um processo que culmina e se esgota na arguição e avaliação de uma banca examinadora. Para além daqui, temos duas saídas:

 

 

Feito isso, se lance ao ensino e à pesquisa por um período que vai de meses a dez anos e, só então, volte a sua tese pensando em publicá-la. Até lá, você terá feito um caminho de tamanha autonomia intelectual, terá tantos resultados de sua atuação no magistério e na pesquisa que poderá chegar à conclusão de que sua tese não vale um livro. Vale uma licença acadêmica no exercício da qual você se tornou a pesquisadora, o professor que você é agora. Vale até para você se tornar mestre, doutor, pós-doutor.

 

Já um autor nem sempre se cria ao mesmo tempo em que uma banca confere um grau de doutor[a]. O autor pode ter se formado até antes. Pode vir a se formar depois também, em algum momento de sua trajetória. E se, ao retomar a tese, você tiver a convicção de que ela ainda vale um livro, por favor, nos procure.

 

A produção textual propriamente dita será algo muito simples de fazer. O desenho de seu livro será feito por profissionais, a revisão também. A impressão, numa das boas gráficas com as quais trabalhamos. A essa altura, nosso catálogo virtual já estará no ar, e seu livro será distribuído eletronicamente para todo leitor no mundo que leia em português e pesquise no seu mesmo campo.

 

Mas veja, esse raciocínio se aplica todo à lógica de avaliação de editoras independentes e comerciais como a Parábola Editorial. Obviamente, editoras acadêmicas podem ter, e têm, outro olhar para a seleção de seus livros, concentrando esforços especificamente na divulgação da produção científica produzida em seus institutos, departamentos e faculdades.

 

Isso nos permite dar outra sugestão, esta imediatamente válida para transformar sua tese em livro: “… mas a banca recomendou enfaticamente a publicação”. Nessa hora, dizemos: “Então, por favor, que a banca seja precisa e recomende expressamente a editora universitária que poderá avaliar, aprovar, contratar e publicar sua pesquisa”.

 

Recomendação protocolar não serve. Publicação protocolar, que valha mais para o autor do que para o público, também não. Aqui fazemos do nosso modo, meio duro, meio colado à educação pela pedra que nos é transmitida pelo poeta.

 

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