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A evolução das formas gramaticais reúne os principais textos sobre linguística geral escritos pelo linguista francês Antoine Meillet (1866-1936). Marcos Bagno organizou essa edição inédita no Brasil, selecionando, traduzindo e comentando cada um dos textos por ele escolhidos para essa edição inédita. Temos aqui uma contribuição fundamental para a fundamentação e o avanço dos estudos linguísticos no Brasil.

Meillet, o propositor do termo gramaticalização, nunca escreveu um grande manual de linguística geral. Sua preferência foi sempre publicar análises de temas específicos no formato de artigos para diversas revistas acadêmicas. Do conjunto desses artigos, é possível deduzir princípios para uma linguística geral, em particular para o estudo da mudança linguística. E tais princípios são balizas que mantêm heuristicamente vivo o pensamento de Meillet, em especial para o enfrentamento das complexas relações língua e sociedade.

Desde o nascimento da linguística moderna, aparecem duas tendências: uma que consiste em acentuar essencialmente a forma da língua e outra que insiste em suas funções sociais. Para além dessa ruptura, naqueles primeiros anos do século XX, aparecem na Europa, singularmente na Europa francófona, dois paradigmas diferentes: um que, a partir de Saussure, conduzirá ao estruturalismo, e outro que, a partir dos autores que evocamos, conduzirá à abordagem sociológica dos fatos de língua.

Contudo, a situação hoje é muito diferente da que Meillet podia imaginar. A linguística como “ciência social” não se constituiu, ela sofre de uma espécie de babelismo, de divisões bizantinas entre sociolinguística, psicolinguística, antropologia linguística etc., sendo o conjunto abrigado no balaio de gatos chamado “ciências da linguagem”. Meillet não queria criar, ao lado da linguística, outra ciência, a sociolinguística, mas queria que a linguística assumisse seu estatuto de ciência social. O que realmente não se deu…

Antoine Meillet foi o pensador que, na virada do século XIX para o XX, mais claramente estabeleceu as bases gerais de uma linguística que integrasse fatos sistêmicos (puramente linguísticos) e fatos sociais. As coordenadas de seu pensamento, se ficaram à margem das principais tendências da linguística durante algumas décadas, foram relidas e retomadas na criação e desenvolvimento da sociolinguística, em especial na teoria proposta por Labova partir da década de 1960.

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Além dos artigos assinados pelo próprio Meillet, este livro abriga também dois textos produzidos especialmente para esta edição. O primeiro é o prefácio de Louis-Jean Calvet, sociolinguista francês de renome que há bastante tempo vem reivindicando para Meillet um lugar de maior destaque na historiografia da linguística, sobretudo por sua abordagem social dos fatos de linguagem, uma abordagem que antecedeu em meio século o surgimento e desenvolvimento da disciplina que, a partir da década de 1970, se firmará com o nome de sociolinguística. O segundo é uma compreensiva introdução de autoria de Carlos Alberto Faraco.

Falar de Antoine Meillet é, quase inevitavelmente, falar de Ferdinand de Saussure, e por diversas razões. Meillet foi aluno de Saussure na École Pratique des Hautes Études, em Paris, a partir de 1885. Em 1894, substituiu o mestre suíço na mesma instituição. Os dois estudiosos mantiveram contato epistolar até a morte de Saussure em 1913. Na historiografia da linguística, as relações entre os dois estudiosos são vistas ora como convergentes, ora como divergentes no atinente a concepções de linguagem. Para ilustrar esses encontros e desencontros, este livro traz uma segunda parte que reúne o texto produzido por Meillet logo após a morte de Saussure, a resenha feita pelo francês do Curso de linguística geral, uma carta do linguista suíço a seu ex-aluno e dois artigos historiográficos, um de Konrad Koernere outro de Christian Pueche Anne Radzynski, derivados de um colóquio ocorrido na França em 1986, por ocasião do cinquentenário de morte de Meillet.

Com essa publicação, esperamos aproximar os estudiosos brasileiros da história da linguística do pensamento daquele que foi em sua época o linguista mais destacado de seu país.

Boa leitura!